segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Crônica de Natal


Sem aparente explicação, eis que desaparece alguém que estava aqui ao nosso lado, como quem partiu ou morreu. Mas então, não é Natal, época de ganhar presentes e saudar velhos amigos? E quando se parte tão jovem, uma vida inteira pela frente, deixando para trás rastos de lembranças e saudades? Para os viajantes precoces, o que existirá de recompensa em seu destino final como compensação pelo fim abrupto de suas vidas? Um leito macio onde gozarão os amores não vividos? O calor materno nas noites de frio? Um cão amigo para chamar de seu e acompanhá-lo nas horas de solidão?

“Para isso fomos feitos: / Para lembrar e ser lembrados / Para chorar e fazer chorar / Para enterrar os nossos mortos — / Por isso temos braços longos para os adeuses / Mãos para colher o que foi dado / Dedos para cavar a terra.”... assim já dizia o poetinha Vinicius no seu “Poema de Natal”. Não há muito o que dizer, não é mesmo, poeta? “Uma canção sobre um berço / Um verso, talvez de amor / Uma prece por quem se vai”.

Sei de uma família que não celebrará o Natal este ano. As luzes continuarão lá, iluminando o centro da pequena cidade. Casas de portas abertas, risos fartos, alguns fogos de artifício a iluminar o céu nublado, mas nada disso alcançará o seio daquela família entristecida. Quiçá eles viajem para outra cidade, longe de tudo e de todos, onde possam celebrar em paz a dor pungente que neste dezembro habita seus corações.

“Um verso, talvez de amor”... e o amor a tudo resiste, não é mesmo, poeta? Mais do que o tempo, a nos carregar pela mão rumo aos braços da morte, é o amor, a nos enlevar o espírito, que nos revela o sentido da vida. Seria simples amar, não fosse a capacidade humana de impurificar a essência do amor, a cortiná-lo sob outras vestes, impondo, assim, a condenação eterna da busca.

Pensar no amigo que se foi, na amada de olhos ateus, deixar que as vistas percorram as estrelas, para além de Órion, Aldebaran e todas as outras constelações visíveis a olho nu, espreitar a lança de Jorge a desafiar o dragão, esperar a noite descer em silêncio, com seu abraço gelado como quem diz: Feliz Natal.

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